Recentemente, falei aqui sobre a relação entre diabetes e
doenças do coração. Sobre como a
glicemia alterada pode aumentar as chances do desenvolvimento de doenças
cardiovasculares (Leia E o coração padece).
Se por si só o descontrole glicêmico traz risco, pior é
quando existe uma comorbidade, outra condição para colocar o coração em perigo
ainda maior.
Uma das mais comuns e insuficientemente consideradas é a
dislipidemia, caracterizada pela presença de níveis elevados de lipídios
(gorduras) no sangue. Ou seja, níveis elevados de triglicérides e colesterol. O
que é comum entre no DM2. Um estudo realizado na Alemanha com cerca de 1.200
pessoas com diabetes tipo 2 mostrou que quase 55% tinham dislipidemia e, desses,
apenas 23% conseguiam atingir as metas com relação ao perfil lipídico.
As principais gorduras que circulam no sangue são:
·
Triglicérides: Moléculas formadas por ácidos
graxos (gordura) e glicerol (um álcool). Têm a função de armazenar energia. O
aumento de triglicérides é a alteração de gorduras sanguíneas mais frequente no
diabetes tipo 2. Especialmente porque a resistência à insulina eleva a
concentração de triglicérides no sangue.
·
LDL-c: lipoproteína de baixa densidade. Como
próprio nome diz, é uma molécula composta de gordura e proteínas carregadoras
(já que, sozinha, a gordura não se mantém no meio aquoso do plasma/sangue). É o
chamado colesterol ruim. Transporta o colesterol produzido no fígado e
intestino para as membranas celulares. Em excesso, tem potencial
antiinflamatório e aterogênico, ou seja, favorece a formação dos ateromas, as
placas de gordura que se prendem ao endotélio, o revestimento interno das
artérias.
·
HDL-c: lipoproteína de alta densidade. Também
uma molécula de gordura e proteínas. Tem a função de remover o excesso de
colesterol dos tecidos e levar para o fígado, onde é degradada. Tem função
protetora nos vasos.
Hoje, o foco do tratamento da dislipidemia está em manter o LDL-c
dentro das metas terapêuticas. O que é ainda mais mandatório para os indivíduos
com diabetes. Isso porque a glicemia elevada provoca a chamada glicação do
LDL-c. É uma reação química que tem como primeira consequência o aumento da
meia-vida do LDL-c. Ou seja, o tal colesterol ruim fica mais tempo circulando e
fazendo estrago. Sim, porque esse processo de glicação também facilita a
oxidação da molécula, aumentando o potencial de agressão ao endotélio e de
formação de ateromas. Sempre lembrando que são essas placas de gordura que
podem provocar os chamados eventos cardiovasculares, como infarto e AVC
(acidente vascular cerebral ou derrame).
Por isso para as pessoas com diabetes o risco é maior mesmo
com igual grau de dislipidemia de uma pessoa sem diabetes.
O tratamento intensivo para redução de LDL-c é o melhor caminho
para a prevenção de problemas cardíacos. Diversos estudos já demonstraram redução
significativa dos eventos cardiovasculares agudos naqueles que atingiram alvos
mais rigorosos de LDL-c.
Veja as metas terapêuticas preconizadas pela SBC (Sociedade
Brasileira de Cardiologia):
Qual o seu risco cardiovascular? Essa avaliação é feita pelo
médico, preferencialmente um cardiologista. Para ter uma idéia, você pode
usar a Calculadora para Estratificação de Risco Cardiovascular da SCB,
Mas saiba que, por causa de tudo que foi dito acima, quem
tem diabetes é em geral considerado um paciente de alto risco cardiovascular
pelo simples fato de ter diabetes. Se já tiver sofrido algum evento ou tem diagnóstico
de cardiopatia, vai para a categoria de risco muito alto. Nos dois casos, devem
ser mantidas metas restritas com relação aos lípidios sanguíneos, de acordo com
a tabela da SBC.
E o tratamento? As estatinas são os principais medicamentos
utilizados para combater o colesterol elevado. Atuam no fígado, inibindo a
síntese de colesterol. Existem nada menos do que 7 tipos de estatina, que
variam de potencial de ação. Para complicar, a resposta ao tratamento com
estatina varia de indivíduo para indivíduo. Daí porque é recomendada
reavaliação a cada três meses (exames de laboratório), para garantir a
manutenção das metas.
Para aqueles que, mesmo fazendo uso da estatina, continuam
fora da meta, o tratamento deve ser intensificado. As diretrizes atuais da
Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) propõem três estratégias: 1) aumentar a
dose da medicação em uso; 2) trocar a estatina por outra mais potente; ou 3)
associar a estatina com outro fármaco, a ezetimiba, que reduz a absorção
intestinal do colesterol. Existe ainda uma nova classe de medicamentos para
baixar o colesterol, os inibidores da PCSK9. Ao bloquear essa proteína, o
remédio aumenta a capacidade do fígado de reduzir o LDL-c. É um medicamento
injetável e de custo elevado, mas que pode ser eventualmente considerado para
pacientes de muito alto risco que não conseguem atingir as metas mesmo com o
uso intensivo de estatinas.
E então? Já mediu seu colesterol este ano?
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